visão

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sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Na quinta vez que eu morri



   ‘’ Você lê, ouve e até sabe bem lá no fundo que nada é para sempre, mas você é teimosa e quer provar ao mundo e às pessoas que elas estão erradas. ’’ -Me disse certa vez uma amiga. No dia em que meu coração virou pó e morri pela quinta vez, eu estava sobrecarregada por uma inebriante vontade de correr, mas correr para os braços que não me queriam que não me protegiam e que não sabiam cuidar de mim. Segurei-me mentalmente, fiz meu café da manhã, numa casa em pleno silêncio, numa rua quase abandonada, numa cidade fim de mundo e eu não tinha certeza se as gotas de chuva que restaram da noite passada que continuavam pingando incessantemente do telhado e ecoando no chão eram um reflexo bagunçado do meu eu interior ou se era a minha casa tentando gritar, num tom quase abafado de que necessitava de uma reforma.
   O almoço foi uma mistura de sons atrapalhados, garfos se arrastando nos pratos e sussurros mal ouvidos, eu estava sem fome. Tomei uma ducha numa temperatura proveniente das geleiras do ártico, pus a primeira roupa do guarda roupa e fui embora. Para a casa dele. O clima que se seguiu foi irreconhecível, sem nenhum olhar acolhedor,sem nenhum toque, seguido de  uma sequência de filmes sem nenhum sorriso ou voz e em mim uma ânsia desesperada para sair dali.E fui.Mas ele me levou em casa, embora eu tivesse recusado a sua tentativa fracassada de cavalheirismo, depois de minutos em silêncio profundo, num agonizante conjunto de murmúrios e pensamentos mentais, resolveu abrir o jogo, mas que jogo horrível aquele de que o amor havia morrido. Meu coração não aguentou e soluçou lágrimas, suas palavras ecoavam dentro de mim, minha garganta havia ganhado dez quilos, minhas mãos viraram poça de água, contive o choro.
   Quando morri pela quinta vez, belisquei-me disfarçadamente na vontade de acordar de um pesadelo, mas fui sacudida pelo pragmatismo e envolvida por um momento de ceticismo e cinismo, quis sorrir, não, melhor que isso, gargalhar. Ele me revelou uns olhos vermelhos, aturdidos e confusos, como se pudessem chorar lágrimas de crocodilo a qualquer hora, mas não me despertou pena, apenas náusea. Eu queria vomitar, mas contive a expulsão do meu conteúdo gástrico, era humilhação demais, também quis bombardea-lo de pancadas,pois meu coração estava sendo enfiado forçadamente na minha caixa torácica, mas desta vez quebrado e vazio.
  Reneguei qualquer tipo de vinculo futuro e o mandei embora. A verdade?O amor nunca tem fim, mas paixão e desejo sim. Mas eu não precisava de tantas palavras bonitas, promessas incumpríveis e um sentimento banal, para depois serem jogados num caminho sem volta, numa ladeira infinita,mas nunca se está preparado para esses tipos de coisas, embora se devesse sempre estar.
   Quando morri pela quinta vez, minha mãe cuidou de mim como alguém que havia regressado de uma longa jornada, ela me sorria um sorriso leve, que ia se esvaindo pelos cantos dos lábios aos poucos... numa vontade frustrada de me causar conforto.
Pobre mamãe, me aturou assim por mais ou menos cinco dias.Uma filha chata, insuportável, que chorava cada vez que via e lembrava algo.Eu ficava tentando sempre me focar num pensamento voltado para coisas sem importância e fúteis, como o porque da Fátima Bernardes não estar com o cabelo liso na TV, ou o porque que eu não havia comprado aquela blusa na liquidação do mês passado, coisas bobas, mas que eu queria que voltassem com toda ferocidade ao meu cotidiano.Coisas simples, mas que formavam o meu mundo, e faziam de mim tudo o que eu era, antes de ficar sentimentalmente embriagada por um aleivoso olhar masculino.
  Quando o amor morreu, levei mais de vinte e quatro horas para desabar em choro, e quando ele veio num turbilhão de confusão dentro de mim, eu era o próprio dilúvio, e estava perplexa demais com a quantidade de água que havia dentro de mim, eu teria que me reabastecer logo. Minha morte durou cinco dias de profundo sentimentalismo, saudade e remorso.Fiquei sendo consumida pelo meu abandono, e engasgada por minha própria saliva.Era como morrer no raso, no seco, minha morte mais angustiante.
   A dor diminuía, mas eu sempre voltava, e voltava para aquele banco onde a gente sentava, voltada para aquela música que ele gostava, voltava para ele, mas ele não estava mais lá e também lembrava, lembrava do seu cheiro almiscarado, lembrava quando ele me chamava de estrela, lembrava das brincadeiras e quando dizia que tudo ia dar certo, mas o estranho seria se dessa vez tudo desse certo para mim.
  Mas depois que a dor foi indo embora e o choro não caia mais, eu ousei sorrir e dessa vez...ah...dessa vez o sorriso grudou e não sai mais de mim, por que cada momento era um milagre e a alegria sempre me reencontrava a cada manhã e antes que eu me corroesse de pena por estar sem ele, sinto é pena dele por estar sem mim, pois largou mão da única estrela que não parava de brilhar só para ele.

                                           


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